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Mostrando postagens de 2015

Álvaro Vince, sem roteiros (Parte IV)

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          As chamas do fogo dançavam no alto e davam beijos estalados nas paredes de madeira. O pequeno casebre fora totalmente consumido pelo incêndio. Não haveria nada ali que pudesse ser salvo.             O garotinho chorava e agarrava-se as pernas da mãe. Era a sua casinha. Por que seu pai tinha feito isso? Por que ele destruíra a própria casa? Onde eles iriam morar agora?             Olhou para cima, com a finalidade de observar o rosto da mãe. Ela não chorava, mas nos seus olhos ele podia ver uma dor lancinante. Abraçou-a com mais força do que podia com seus braços magricelos. Queria dizer com tal gesto que estava ali, do lado dela.             Seu pai sempre bebeu muito, brigou muito e de vez em quando lhe batia com força. Mas nunca antes tinha feito algo que ele considerava tal abominável. Ele não queria mais ter um pai, só precisava da mãe e ficaria ao lado dela para sempre. Jurou para si mesmo.             A visão de Álvaro estava turva. Há muito tempo não s

Bem-vindos! Mas não queiram ficar...

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Bem-vindos ao mundo no qual a demonstração de afeto é algo absurdo. Onde o amor é "coisa de filme" e os bons sonhos são bobagens. Bem-vindos ao mundo em que o egoísmo vale milhões e o caráter não vale mais do que alguns centavos. Bem-vindos ao mundo em que a alma não significa muita coisa e a fé é apenas um acessório a ser pendurado no pescoço. Sejam todos bem-vindos! Mas, por favor, não façam questão de ficar. Sempre podemos escolher o diferente e, quem sabe, construir um novo mundo. Está tudo aí, nas nossas mãos! G. C. L. A.

Às vezes é difícil dar tchau

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Às vezes é difícil dar tchau. Sair por aí, sem mais ninguém, com uma mochila cheia de esperança pendurada nas costas, procurando por si mesmo. E descobrir-se em uma antiga fotografia, com os cabelos despenteados, os olhos brilhando e o sorriso inocente de criança. As mudanças estão sempre nos acompanhando. Na nossa rotina quase cega, esquecemos-nos de ver o que fomos um dia e o que ainda deve permanecer em nós. Uma dica importante é guardamos a nossa essência em uma pequena  caixa, para que caiba na nossa mochila e não seja esquecida em nenhuma despedida. Adaptamos-nos ao meio. Ao convívio e ao que esperamos de nós mesmos. Nos cobramos tanto que esquecemos da simplicidade, do cheirinho de chuva e da rede armada na varanda. É como escrever o nosso nome e não reconhecer a própria letra, mas saber que aquilo ali, naquele papel, é sobre você. Os olhos não precisam ser rasos, nem decifráveis. Mas alma, com certeza, necessita de profundidade. Procurar-se e encontra-se. Há semp

Conto de olhos nublados e coração cego

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Pegou o seu Machado de Assis. Ficou divagando sobre a vida enquanto passava os dedos vagarosamente sobre a capa. Abriu o livro na página que estava marcada, mas não conseguiu formar sequer uma palavra na sua cabeça. As letras pareciam estar todas embaralhadas. Olhava para o papel e não via a história, nem a mão, nem a luva. Continuou com o livro aberto, entretanto já não tentava mais ler. Deixou que seus pensamentos lhe guiassem. Há muito queriam fazer isso. Uma lágrima caiu dos seus olhos. Não se preocupou em limpá-la, pois ninguém veria. Ela estava sozinha em casa. Tinha a personalidade inquieta e sorriso fácil. Gostava bastante de conversar, mas hoje não queria que as palavras saíssem da sua boca, preferia guardá-las ou se pudesse preferia esquecê-las. Fez o que jurara para si mesmo não fazer. Mas quem nunca? Quem nunca quebrou um juramento? Dissera para si mesmo que não se arrependera e que fora uma boa escolha. Entretanto, bem no fundo (talvez nem tão fundo assim), ela

Carta ao que já fui

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              Querido,             Durante muito tempo eu fui trapezista de um circo. Desses de pequeno porte que vagam em várias cidadezinhas para levar alegria e um pouco de diversão por onde passam. Eu adorava estar no picadeiro! Minha parte preferida era quando o público ficava admirado com as minhas piruetas e impressionados com a minha capacidade de dançar bem lá no alto... A vida era uma correria sem tamanho, mas não havia nada mais prazeroso nesse mundo do que ver as pessoas se aglomerando e sorrindo dentro daquela lona colorida, cheia de balões. Circos deveriam ser considerados a tenda das felicidades, por mais ilusórias que sejam, ao menos trazem distrações para quem tanto se preocupa com outras coisas, por menores que possam parecer.             Alguns dos meus dias não eram muito fáceis também. Entretanto, sempre que vestia minha roupa e prendia o meu cabelo para entrar em ação, o mundo parecia ganhar cores e formas diferentes. Os sorrisos mostravam-se sinceros

Retrato

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Estava totalmente perdido na imensidão desenfreada do destino. Ontem era apenas um menino. Veloz no seu caminhar e sem muito no seu pensar.Hoje, com sábias palavras sobre experiências vividas em tempos de alegrias contidas, no velho alcance do quebra-mar. Eram poucos passos para a sina enfadonha, chorando a velhice, o passado e a vergonha do lar descontínuo. Os braços não alcançavam mais os sonhos. O futuro era triste e medonho, não fazia jus ao que fora prometido. Não sabia nada sobre a morte, nem tampouco tivera a sorte para acolher um bom amigo. O frio invadia a madrugada. O clarão da velha estrada dava um toque sutil ao luar. Nunca fora sereno, nem mesmo quando pequeno. Criança não voltaria a ser. O cheiro maternal lhe lembrava o abuso. O pai, ele nunca voltara a ver. Os olhos amendoados da menina na escola, sua lembrança mais feliz durante toda a vida. O adeus precoce sem causa remediada. Com a dor premeditada. A lembrança mais triste e a ferida incurável. Sobrevi

A jornalista Gabriela Aguiar lança seu segundo livro neste sábado (6)

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Livro à Beira da Estrada será lançado durante o Bate Papo Literário no 13º Salipi às 19h00 Motivada pela curiosidade de saber como era a vida dos moradores dos lugares isolados no trajeto que fazia de Teresina a Corrente quando criança, a jornalista Gabriela Aguiar lança seu segundo livro. "À Beira da Estrada" é um livro reportagem que traz histórias, hábitos, rotinas e curiosidades sobre pessoas que vivem afastadas das cidades, em casinhas à beira da estrada. “Quando eu era criança, morei no interior do Piauí, em Corrente. E sempre que viajava de Corrente para Teresina e via algumas casinhas no meio da estrada, bem longe de qualquer centro urbano. Eu me perguntava sobre a vida daquelas pessoas. Como faziam para se locomover, se tinham amigos, se frequentavam a escola, quais eram seus sonhos, se estavam ali por opção e se preferiam viver em outro lugar. E "À Beira da Estrada" veio como uma forma de responder as minhas curiosidades, as minhas pergunt

De coração

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Sou dessas que fazem as coisas com o coração. É, com o coração! Se não faz bem, descarto. Se me agrada, logo me apego e dou o meu melhor para que aconteça, para que cresça. Mas é sempre (tudo) com o coração. São retalhos (bem pequenos) de coisas que absorvi ao longo da vida. E por coisas, pode-se entender que pessoas também. Pedacinhos costurados de “no que eu me transformei”. E é por isso que faço de coração. Por achar nele um motivo (muito inexato e com vontade própria) para acreditar que tudo pode ser melhor. Ah sim! O texto foi (quase) de coração. Talvez a razão tenha ditado algumas palavras, em alguns dias é um pouco difícil separar um do outro. Mas quem se importa mesmo?

Álvaro Vince, sem roteiros (Parte III)

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As ruas da cidade estavam quase vazias. Eram poucas as que pessoas circulavam tarde da noite, ele pensou. Provavelmente seria por isso que aquele fosse seu horário preferido para dar uma volta. A cidade tinha mesmo um tom melancólico. O barulho do vento assoviava ao balançar as portas de ferro de algumas casas aparentemente abandonadas. Se acrescentasse um uivo, com certeza seria a descrição perfeita de um filme de terror. Desses em que vítimas são perseguidas e conduzidas pelo seu algoz sem nem perceber e quando se dão conta, a morte é uma certeza. Sorriu irônico. Deveria colocar o velho Getúlio numa armadilha dessas. Só para ter certeza de se o coração dele aguentaria uma dose extra de sustos e adrenalina. Mas o velho estava mais para o “caçador”, do que para vítima. Ah, isso ele nunca seria de verdade, “a vítima”. Caminhou até uma pracinha iluminada. Banquinhos de madeira estavam espalhados perto de grandes árvores. Alguns jovens veriam aquilo como romantismo, um lugar id

Álvaro Vince, sem roteiros (Parte II)

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Bateram à porta do seu quarto. Pelo horário devia ser o serviço do hotel trazendo o jantar. Eram pontuais e ele gostava disso. Abriu a porta e deu de cara com os olhos negros e sombrios, era um hotel bem pequeno, a camareira deveria exercer várias outras funções, ele presumiu. - Sr. Vince, o jantar que foi pedido. – Ela apontou com a cabeça para a bandeja de comida. - Pode entrar e servir na mesa que está vazia - Ele respondeu seco. A mulher um pouco baixa e muito séria entrou no quarto e começou a preparar a mesa para o jantar. Álvaro observava-a atentamente, ela seria uma boa inspiração para algum personagem. Tinha certeza disso. - Algum problema senhor? – Ela indagou-o com o rosto duro. - Não. Qual seu nome? - Débora – Ela foi incisiva. - Combina com você. - Dizem – Débora deu uma resposta inconclusiva– Tudo pronto aqui. Boa noite e boa ceia – Pegou a bandeja vazia e retirou-se batendo a porta. Álvaro achou curioso uma mulher que falasse tão pouco, principalme

Carta ao (mau) amor

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Cansei de chamar-te, querido. Cansei de dar-te todos estes nomes carinhosos que outrora fazia gosto em falar. Cansei de bem querer-te. Não me preocupo mais em pronunciar-te como o meu único e indiscutível amor. Durante algum tempo fostes meu e de mais ninguém. Era um sentimento de posse, desses que o amor nos permite ter. Não que não fosse repartido, mas a sensação era de que eras de fato meu. Porém o sentimento pertencia somente a mim. É impossível doar-se sem receber um mísero tostão de carinho em troca. Acreditei em palavras frias de uma mente vazia sem um coração com veias pulsantes. Pensei que poderia lhe trazer a vida, mas ao invés disto, foste tu que roubastes a minha. Não tiveste nem a consideração de absolver uma ré inocente do teu julgamento falho. Cansei de esperar-te para ser feliz. Buscarei a minha felicidade e a encontrei sozinha, sem a ajuda de mais ninguém. É, de fato, bem melhor quando se é compartilhada, mas neste caso cansei de mendigar a tua atenção. Prec

Álvaro Vince, sem roteiros (Parte I)

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                           Ele estava em algum lugar do mundo bebendo o seu café. A fumaça fina saía pelas bordas da xícara branca e perdia-se no ar gelado. Não importava em que país estivesse sempre tomava café todos os dias ao anoitecer, mesmo que isso às vezes fosse muito difícil.             Tinha o péssimo hábito de pensar. Pensar sobre tudo, ele dizia. Até sobre a longa jornada de algumas formiguinhas ao subirem a parede do quarto. Pensava sobre o ócio, refletia sobre o trabalho árduo, julgava os descrédulos e abominava os otimistas. Era tudo uma questão racional. E pensar, era a qualidade ímpar de um ser racional.             Pousou a xícara sobre o pires delicado e passou a observar a paisagem lá fora. Era inverno. Tudo estava cinza e branco. Tons melancólicos, ele ponderou, dariam uma boa inspiração para um filme de suspense ou para um drama. Pegou seu lápis e rabiscou alguma coisa num bloco de folhas brancas.             Roteiristas se inspiravam em coisas

Pra terminar essa canção

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Estava olhando meus recados passados Costurando os meus retalhos Que você nunca se quer notou Era pura indiferença essa ausência de pudor Os teus escândalos mais irritantes Sem promessas nenhuma, sem algum valor As estrelas sussurravam ao meu ouvido Que tudo aquilo não fazia sentido Tanta carência da boca pra fora Tanta mentira disfarçada de contos de fadas Eu acreditei da melhor forma possível Transformei meus sonhos num lago invisível Por que meu Deus essa roda de hipocrisia? De gente que torna as verdades frias Eu só queria um pouco mais de melodia Uma forma mais bonita de fazer uma canção Seria pedir muito por um pouco mais de compreensão Mendigar centavos de uma fatia de carinho Os meus recados passados agora estão surrados Meu coração já não caminha pelo mesmo destino Mas ainda me importo com rios passados E quem é você pra falar do meu choro descuidado? De que forma isso te traz algum grado? Escute mais os conselhos da razão

A curta história de Relógio

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            Relógio era solitário e triste. Não gostava de desempenhar a função para qual fora designado. As pessoas sempre viam o seu badalar com ânsia ou aflição. Nunca prestavam atenção no que ele realmente era.             Estava pendurado naquela parede branca e fria há mais tempo do que conseguiria se lembrar. E em todo esse “tempo” não vira nenhum sorriso sincero, mas presenciou muitos dedos nervosos se cruzando e algumas lágrimas sendo derramadas. Ele sabia que não era sua culpa, se pudesse, ajudaria...             As pessoas costumavam reclamar que ele poderia passar mais depressa ou simplesmente voltar o tempo. Mas Relógio não tinha o poder de fazer isso. Uma vez ele até tentou... O máximo que conseguiu foi parar seus ponteiros, entretanto, nada ao seu redor estagnou. Ele é que foi sozinho passar duas semanas no conserto.             Relógio ficava inconformado porque as pessoas não viam que ele podia marcar suas melhores alegrias e, com algum tempo, curar as

Por amor às causas perdidas

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Às vezes fico me perguntando por que mesmo nós temos que crescer e nos tornar adultos chatos, sem nenhuma sensibilidade ou espontaneidade que tínhamos quando éramos crianças. Ah, sim, somos adultos insuportáveis! Bom seria se pudéssemos dar uma volta na Terra do Nunca. Não culpo o Peter Pan por escolher morar lá. Talvez eu também escolhesse ficar. Quantos mais não optariam por isso? Quando a gente é criança, pensa que ser adulto é o máximo! Poder dirigir, ir pra onde quiser, ser o que quiser... Mas aí quando crescemos, os sonhos vão minguando... Ficando escassos. Aliás, existe mesmo algum sonho?  Ser astronauta torna-se impossível. Atriz de TV é muita exposição. Detetive é perigoso demais. Astro do rock é muita instabilidade. Escritor morre de fome. Professor? Ninguém quer saber. Tudo vai perdendo um pouco a graça. Porque a cada dia nós perdemos um pouco a autenticidade do “ser criança”. Perdemos a nossa vontade de lutar pelas causas “impossíveis” e perdidas. P

Ser música

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                          Os pés se moviam freneticamente ao ritmo da dança. Seus quadris balançavam devagar de um lado para o outro, numa dança sensual e os braços bailavam espontaneamente no ar. Estava livre. Sentia-se livre! A dança era o único meio que encontrava para expressar toda a paixão que havia dentro de si, toda a explosão, mesmo que não fosse por ninguém. Mesmo que fosse por alguém que nunca existiria.             Seu vestido com as bainhas vermelhas, na altura do tornozelo rodava por todo o salão. Segurava-o com tanta naturalidade que os outros que viam pensavam ter sido feito perfeitamente para aquilo. Assim como seus sapatos pretos baixos que pisavam no chão sem deixar nenhuma marca. Tudo parecia combinar com ela, a música, o ambiente, a dança, a flor branca que estava no cabelo castanho.             Seus olhos estavam totalmente concentrados no mundo da lua. Não notara ninguém ao seu redor, nem queria. Cansara-se de pessoas e todas as expectativas que e

A loucura do amor

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O amor, uma doença Outrora fugaz Sem remédio ou crença Do destino liberto, tenaz Uma cólera insidiosa No perfume das flores Sem traços demarcados, vaidosa Em rabiscos de amores Navegando num rio profundo Esquecendo-se  do teu  real nome Com almas de outro mundo Na loucura, sem fome Por fim, ao encontrar a paz Trazendo quietude ao coração O insensato se desfaz Sem saber até quando viverão Gabriela Castro Lima Aguiar

Carta de despedida

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Da escritora triste e solitária Queridos, Os meus olhos tristes choraram por quase toda a madrugada. Numa prisão de amor não correspondido, onde os pássaros compunham uma melodia infeliz por quase todas as estações do ano. Sentia meus ossos doerem. Já estava velha o bastante para qualquer manobra arriscada com meus pés e para me importar sobre o que os outros teriam a dizer sobre mim. Nada mais importava (mesmo). Moro só. Só com as minhas pilhas de livros e personagens. Criei tantos que as vezes era difícil diferenciar se existiram ou não. Talvez alguns tivessem mesmo tido vida, mas é claro que eu sempre acrescentei em todos eles a minha dose de imaginação. Uma velha quase louca. Sorrio quando tenho vontade e choro toda vez que penso em felicidade. Não sou amarga, não sou rancorosa, nem guardo nenhuma mágoa. Sou só triste. Triste porque nunca vivi nada do que escrevi nos meus milhares de textos. Nunca pude ter uma única realização da minha imaginação. Tão fértil...