Álvaro Vince, sem roteiros (Parte IV)


         As chamas do fogo dançavam no alto e davam beijos estalados nas paredes de madeira. O pequeno casebre fora totalmente consumido pelo incêndio. Não haveria nada ali que pudesse ser salvo.
            O garotinho chorava e agarrava-se as pernas da mãe. Era a sua casinha. Por que seu pai tinha feito isso? Por que ele destruíra a própria casa? Onde eles iriam morar agora?
            Olhou para cima, com a finalidade de observar o rosto da mãe. Ela não chorava, mas nos seus olhos ele podia ver uma dor lancinante. Abraçou-a com mais força do que podia com seus braços magricelos. Queria dizer com tal gesto que estava ali, do lado dela.
            Seu pai sempre bebeu muito, brigou muito e de vez em quando lhe batia com força. Mas nunca antes tinha feito algo que ele considerava tal abominável. Ele não queria mais ter um pai, só precisava da mãe e ficaria ao lado dela para sempre. Jurou para si mesmo.


            A visão de Álvaro estava turva. Há muito tempo não sonhava com a sua infância, ele preferia não lembrar-se dela em hipótese nenhuma. Exceto de alguns momentos com a mãe.
            Sentiu uma dor muito forte na cabeça. Passou os dedos a procura de algum hematoma, alguém o havia acertado. Procurou suas chaves e carteira no bolso do casaco. Tudo estava ali, quem quer que o tenha machucado não tinha a intenção de roubá-lo.
            Ouviu uma voz conhecida.
            - Senhor! Senhor! O senhor está bem? – A camareira com os olhos intrigantes e que falava pouco, ele logo a reconheceu. E só então se deu conta de que estava caído na praça.
            - Sim, sim. – Ele segurou a mão que ela lhe ofereceu para se levantar.
            - Aconteceu algo? O senhor se sentiu mal? – A mulher estava aflita.
            - Não... Acertaram-me com algo na cabeça, mas não levaram nada. Meus pertences continuam aqui – Álvaro estava pensativo.
            - Senhor Vince é melhor o senhor ir até a delegacia!
          - Hoje não... Vou voltar para o hotel. Amanhã eu resolvo isso. Costumam acontecer essas coisas por aqui?
            - Não senhor! Aqui geralmente é muito tranquilo. Por isso o senhor deve ir logo para a delegacia.
            - Hoje não – Ele endireitou-se- Obrigado pela ajuda e fico contente se mais ninguém souber isso, principalmente jornalistas.
            - Não direi a ninguém – Ela contorceu os lábios ao prometer.
            - Obrigado.

            Álvaro saiu caminhando sem muita pressa em direção ao hotel. Sentia-se aturdido. Nem tanto pela pancada que levara na cabeça, mas as lembranças... Ah! Elas tinham um poder arrasador.

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