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Mostrando postagens de 2013

Profissão: modelo, ex-morador de lixão

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Não se atreveu olhar para baixo. Tinha medo do que poderia ver e não necessariamente da altura. Os olhos perdidos divagavam sobre a terra de ninguém. Ou ela teria algum dono fincando raízes em outro lugar inóspito? Não queria sorrir, pois não era o momento para isto. Mas não pode evitar.             As pessoas ao seu lado pareciam estarrecidas, embora provavelmente não soubessem o significado dessa palavra. Um aspecto grotesco ainda dominava. Eram obrigados a dividir o seu espaço com aves vorazes a procura de qualquer resto que lhes garantisse a sobrevivência. Pobre, bem pobre, existência.             Ele não se recordava ao certo como havia ido parar ali. Nascera longe, numa cama ensanguentada de hospital. Fora colocado para ninar em um berço de papelão e então rodou por vários lares até que, no fim, foi acolhido num pequeno barranco. Aprendeu a chamar de pai um rapaz que era muito jovem, e de mãe uma velha senhora. Quase ao mesmo tempo soube que precisaria trabalhar e

Meu herói

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Vô Zuzinha foi um herói que, no tempo devido, aposentou seu cavalo. Trouxe a esta terra todo o seu gado e aqui formou os laços mais fortes desta vida. Encontrou um grande amor e o frutificou 11 vezes. E em cada uma destas, mais sementes de amor foram plantadas. Ele acolheu a cada uma com sua fé inabalável da firmeza de uma família. Como todo grande herói, ele enfrentou todos os seus desafios. Não desistiu quando tudo conspirava para isso. Persistiu, insistiu. Fez suas escolhas e traçou um caminho bonito e aconchegante para todos os seus seguidores. Tinha o super poder da bondade, um muito difícil de ser encontrado. Usava-o sempre, sem medir esforços. Estendia sua mão a todos, não julgava cor, classe ou origem. Ele voava também. Voava no tempo e trazia consigo histórias para quem quisesse ouvir. Além de tudo isso, ainda tinha o incrível poder de sorrir, mesmo quando alguma vilania do destino ameaçava a alegria. O super herói mais forte, eu diria. Não tinha medo de nada, nem m

Praia do Arqueiro

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Dirigi no automático por mais ou menos duas horas, ou pelo menos eu achei que tivesse sido. Só fui me dar conta de para onde eu estava indo quando cheguei no local. Uma espécie de refúgio para algumas aves perdidas e para almas que erraram o caminho. Mais almas do que aves. Respirei fundo no banco do motorista e contei até 10, mantendo o ritmo da inspiração e da expiração. Vi através da camada fina de neblina que meus companheiros pássaros estavam mais contentes do que eu. Isso era bom. Eles estavam alheios ao tempo. Fazia quase uma semana que não se via o sol. Eu gostava de dias nublados, mas, às vezes, as cores faziam falta. Desliguei o carro e fui de encontro ao mar. Não queria nem pensar no frio infernal que a água deveria estar, entretanto, ela melhor pensar em qualquer coisa do que em pessoas. As coisas não conseguiriam nos decepcionar, pelo menos não por vontade própria. Olhei para as aves entretidas com os siris na areia. A praia do Arqueiro lembrava o abandono. Antiga

Não ouvi o suficiente

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Terremotos de vaidades Explodem no meu doce inconsciente De todos os discos e bandas De todos os tipos de gente Grades de ferro não barram saídas De todos os meus desafios Sem cordas obscenas de nylon Das mais humildes feridas Poderia me manter forte E desejar ter toda a sorte De um nômade no paraíso Se é que é preciso força pra isso Andarilhos que não buscam trilhas Passagens de volta, em milhas Queria poder ouvir tudo Sem voltar a cada dia da semana Gabriela Castro Lima Aguiar

Querido Ulisses,

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                Não sei como aconteceu, nem tampouco qual foi o motivo para que nos distanciássemos assim. Acredito que a culpa não tenha sido sua, nem minha. Do tempo talvez, mas por que responsabilizá-lo se ele é incapaz de voltar? Então o problema deve ter sido das circunstâncias. Mas também não vou julgá-las. Sou incapaz de saber exatamente quais foram.                 A verdade é que talvez não ajam culpas. Provavelmente existam arrependimentos, mas não estou tão convicta quando a isso. Afinal, coisas feitas de maneiras diferentes podem ter obtido um resultado melhor do que o esperado. Eu deveria lhe pedir desculpas pelas duas vezes que lhe ignorei, mas seria cinismo da minha parte dizer que não fiquei feliz. Porque fiquei por mim, por me mostrar que já não era tão importante assim. Lembre-se apenas de que quem começou foi você.                 Acho que no final de tudo eu não era tão boazinha quanto você pensava. E nem tão idiota como eu imaginava. Mas isso é um mérito

Correr para o mar

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É sempre bom saber nadar Vai que um dia inunda Vai que um dia o barco afunda Como o Titanic colidindo com o iceberg É sempre bom mergulhar Descarregar as energias no mar E deixar que as ondas levem Todo o mal que houver em si É sempre bom saber amar Deixar a vida mais leve E a respiração mais sincera É como saber nadar e mergulhar Gabriela Castro Lima Aguiar

O poeta que não escrevia

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Sorria discretamente. Começava no cantinho da boca até que a alegria se espalhava pelo resto do seu rosto. Era uma mistura de mistério com preservação. Não porque tinha medo de se mostrar, mas porque gostava de ser assim. Ele não gostava de ser o centro das atenções, preferia observar o mundo e entender um pouco de toda aquela loucura. Chegava a ser filosófico, mas não embasado em teorias de Platão ou Aristóteles, tudo que sabia tinha aprendido na vida. E qual escola melhor do que essa?             Talvez ele não fosse brilhante em decifrar mapas ou entender perfeitamente as pessoas, mas era dotado de uma sensibilidade para tentar compreende-las, mesmo que não fizessem sentindo algum. Não julgava. Conseguia perceber os detalhes que outrora qualquer outra pessoa teria deixado passar. E isso ainda estava atrelado a um bom senso se humor, não se aborrecia tão facilmente. Na verdade, era um tanto quanto difícil deixá-lo irritado com algo.             Um louco, poderiam dizer. Talv

Bom dia linda roseira, como vai rosa faceira?

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                Era assim que minha avó minha acordava. A nossa tristeza não é porque minha avó se foi, até porque ela está num lugar bem melhor.  A nossa dor é só saudade. Saudade dos sorrisos, das cantigas, das histórias, dos beijos de bom dia e dos cheiros de boa noite.  Do pedacinho de pizza, só um pedacinho, bem quente. Das azeitonas no almoço. Das lavandas. Das blusas rosa, vermelha, verde e preta. Da sandalhinha de abotoar. Das tangerinas. Dos óculos roxos. Do relógio que quase não fechava no pulso. Da gargalhada alta. Das perguntas sobre o cumprimento das roupas.                 A minha avó não vai mais perguntar se o batom está borrado ou se o blush tá muito forte. Mas ela nunca vai sair do meu coração e das minhas melhores lembranças. Na verdade, eu posso ouvi-la cantando, posso sentir seu abraço ou seu cheiro. Porque as coisas boas sempre ficam.                 A verdade é que seu batom nunca esteve borrado. O blush nunca era exagerado. O perfume era sempre bom. E

Interpretação

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Pele, adere, fere. Irrita, inscrita, crucifica. Tente, ardente, vidente. Bola, esmola, escola. Nua, tua, lua. Voz, nós, sós. Paixão, alucinação, visão. Mundo, imundo, profundo. Amor, rancor, dor. Viver, refazer, conhecer. Entregar, mudar, ficar. Tranquila, tequila, vila. Marfim, fim, para mim. Gabriela Castro Lima Aguiar

Reflexão sobre o egoísmo

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Acho engraçado isso de preocupação. Deve ser porque  geralmente nos preocupamos mais com nós mesmos do que com os outros. Na verdade, os outros só são motivo de aflição quando estão diretamente envolvidos conosco. Caso contrário, não faz muita diferença nas nossas vidas. Talvez seja um exagero, mas é exatamente assim que as coisas funcionam. Você se sente mal, se sente só e necessita de atenção das pessoas. Mas ninguém parece se importar com você. Ninguém foi capaz de lhe perguntar como estava se sentindo ou se estava tudo bem. Não existe tempo para isso, cada um é ocupado demais cuidando do seu próprio umbigo ou dos seus interesses particulares. Mas e você? Você perguntou a alguém hoje como estava? Você foi prestativo com algum amigo? Ou nem se deu conta de que os outros também se sentem sós e também querem atenção? É egoísmo. Sim, somos egoístas em excesso. E pensar que você não é assim é egoísmo também. Porque eu lamento informar, mas todo mundo tem seus bons e maus momento

Common people

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I like common people. They do not identify strongly with me.           Common people are simple. They Have a good heart and the mind almost empty, which is not exactly a flaw. I Think too much about how the depth of the soul of men brings dissatisfaction and sadness. Unimaginable, I would say. It would be nice if everybody were common, with similar tastes, without unnecessary reflections, with a simple life. Everyone would be easy to understand. And there wouldn't be any complications… But in the end it would be unattractive. I like common people, indeed, but I prefer the ones that are not. Cause they are a better vision about the world and they have greater knowledge about everything. They are more interesting people with their problems and mysteries. And I like when people surprise me. Gabriela Castro Lima Aguiar Revisão de texto Ricaro Madeira

Relatos sobre um longo caminho

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Caminhei quase 6 horas sem parar. Não sei o que doía mais, meu corpo ou minha mente. Também não tive tempo para pensar sobre, mas sei que alguma coisa incomodava minha paz interior e latejava em minha cabeça. Talvez meus pés doessem. Porém, se eu parasse ali sentiria tudo com maior intensidade. Então resolvi caminhar até o meu limite físico ou psicológico resolver estourar e mandar minha consciência ir as favas. As marteladas do meu coração acompanhavam o ir e vir dos meus pés que faziam um barulho tranquilizante ao tocarem o solo. Nem sempre eles estiveram ali tão focados no chão. Na verdade, nem sempre eu quis que estivessem ali. Eu preferia quando passeavam pelas nuvens acompanhados da imaginação com uns sorrisos amarelos. As passadas por hora diminuíam, por hora aumentavam sua velocidade. Um pique descontínuo sem nada a perder. Não, não seguia nenhuma canção exatamente ou talvez seguisse várias. Pelo caminho encontrei algumas pessoas com rostos sem muito foco, ele

Descompondo a solidão

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                    Estava cansado de ter que quebrar a cabeça com palavras e no final elas não soarem como ele queria. Já havia composto milhares de outras rimas e canções, sabia o trabalho e a dor de cabeça que elas poderiam causar, mas hoje estava sem paciência para decifrar, desvendar e racionar atrás da lógica musical.             Ele nem mesmo entendia porque sua paciência estava tão escassa assim. Tivera um dia normal, um pouco estressante no hospital, porém nada fora da correria de um médico. Após terminar de atender seu último paciente no ambulatório passara na capela para agradecer por mais um dia, coisa que ele também tinha por hábito. E depois seguiu para casa, onde se encontrava agora sozinho martelando com um pedaço todo rabiscado de papel.             Talvez o problema fosse esse. Estar sozinho. Não, ele sabia que não era. Afinal fora ele que escolhera a solidão. Durante toda a sua vida conquistou muitas pessoas, não porque tencionava, simplesmente atraía as

Xeque mate

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Olhou para o relógio no pulso. Estava impaciente e por isso batia seus pés compassadamente no chão. Mais de 15 minutos de atraso, seria possível que todas as mulheres fossem mesmo desorganizadas quanto ao horário? Ou era apenas parte do charme para deixar a mente de um homem aflorar pelos caminhos que bem entendesse? Nunca saberia a resposta. Nem queria, de fato. Apenas desejava que ela chegasse logo. Ele não era um homem de muitas palavras. Nunca fora um bom observador, nem tampouco sabia analisar qualquer tipo de comportamento. Mas tinha certeza que o que aquela mulher estava fazendo era para lhe provocar um colapso nervoso. Ela sabia que ele possuía a pontualidade inglesa, mas mesmo assim insistia em se atrasar. E vejam só, quase 20 minutos agora. Por que mesmo ele a tinha convidado pra sair? Não tinham quase nada em comum, torciam para times rivais, gostavam de comidas diferentes e a música que ela ouvia era um lixo total. Ele coçou as têmporas lentamente.

A utilidade de uma metáfora

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Eu poderia estar escrevendo um sutil poema, desses em que a alma não se faz pequena. Ou que os versos fossem singelos sussurros do que se passa em torno do meu inconsciente, fingindo não libertar-se da razão que outrora fora mencionada. Talvez houvesse rimas pobres, ricas, intercaladas ou qualquer um desses nomes designados para sintetizar algo. Mas estou escrevendo em prosa que tem toda a sua beleza descrita em parágrafos corridos.             Não é uma questão de preferência ou alternância de estilos de escrita, digo que é vontade. Às vezes me interesso por compor versos, porém há dias em que nada é melhor do que uma prosa seja ela boa ou não. É bem interessante notar que figuras de linguagem, com metalinguagem ou sem, encaixam-se perfeitamente nos dois estilos de texto. Então por que não explorá-los?                                    Uma divisão corriqueira em parágrafos ou estrofes, não há mal algum em ser linear de vez em quando, isso pode ser tra