Não há título que sintetize


           Olhava-me no espelho enquanto outro pedacinho de mim se esvaia por entre meus dedos. Mas eu não ia chorar, prometi a mim mesma e aos que acreditavam em mim. Encontrei todo apoio necessário na minha família e amigos, quando estava quase definhando, muito abaixo do peso, eles estavam lá para me alegrar, cobrindo-me de elogios e palavras bonitas.
            Eu cheguei a atravessar o fundo do poço, não queria mais viver e nem pensava ter forças para isso. Nas semanas em que passei no hospital tinha certeza de que seriam as últimas, não lutava, não me esforçava e nem sorria.  Perdia meu tempo me lamentando, sendo agressiva com os outros e procurando algum culpado.
            Tão jovem, 25 anos, e condenada àquele terrível fardo. Meus pais já estavam desesperados, tentavam de tudo, mas nada surtia efeito; padres, psicólogos, terapeutas, velhos amigos, nada adiantava.
            Um dia, contra minha vontade, fui levada a ala do hospital onde tinham outros enfermos como eu. E uma criança me chamou atenção, com um sorriso amarelo brincando com suas bonecas, tão pequena e fadada a dor, assim como eu... Não consegui me conter e chorei desesperadamente.
            Então ela veio até mim, com suas mãozinhas pequenas, enxugou minhas lágrimas e pediu que não chorasse.
            - Como não? – Respondi atônita
          - Deus lhe deu o dom da vida, assim como deu para mim e sou feliz. Tenho pessoas que cuidam de mim e me querem bem. E gosto tanto de ver o mundo, ele é tão bonito... Você deveria sorrir, acalenta a alma –Prosseguia ininterrupta -Nossos limites são para nos deixar mais fortes e não derrotados –Com um sorriso completou –Vem brincar comigo ?
            Me sentia uma ignorante, uma ingrata, como pude ser tão esnobe a tudo isso? A minha única resposta foi esboçar um sorriso e aceitar o convite da pequenina, com quem compartilhei os meus últimos dias no hospital.
            Recebi alta, mas ainda teria que enfrentar a quimioterapia, com o tempo eu me acostumei com o novo visual, já até me achava bonita careca! Meus resultados progrediram e em um mês eu estaria totalmente livre, ou pelo menos, me sentiria assim.
            Quanto a minha companheirinha, demoraria um pouco mais. Ela também mostrava bons resultados, mas seu caso era um pouco mais complicado. Eu a visitava todos os dias para lhe lembrar do que havia aprendido que com nossa força de vontade podemos superar tudo, até mesmo o câncer.

Gabriela Castro Lima Aguiar

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